Jornais e revistas deste fim de semana (2 e 3 de agosto) trouxeram matérias sobre as obras para as próximas Olimpíadas. O volume de investimento impressiona, juntando novos equipamentos esportivos com antigas promessas, como é o caso da despoluição da Baia de Guanabara, projeto que antecede a escolha do Brasil para sediar os grandes eventos esportivos de 2014 e 2016.

Não quero, no entanto, me focar aqui nas questões das obras em torno destes grandes eventos, ângulo normalmente utilizado para falar deste legado. Infelizmente já temos declarações sobre atrasos de cronograma, o que pode facilmente descambar para contratações emergenciais e com preços superfaturados. Esta é uma questão importante, que precisa de muita atenção, mas que desvia o foco dos problemas do esporte propriamente dito, passando ao largo do espírito olímpico, coisa que parece estar em falta aqui pelas nossas bandas.

Meu cunhado, Alberto Murray, neto do Sylvio de Magalhães Padilha – um dos maiores atletas e ativistas esportivos que o Brasil já teve – é quem primeiro começou a me chamar a atenção sobre a realidade do esporte em nosso país, assumindo posições fortes contra a candidatura do Brasil para sediar tanto a Copa como as Olimpíadas, e também criticando dirigentes esportivos que se perpetuam a frente de clubes e confederações.

As conversas com meu cunhado foram se sucedendo e meu conhecimento sobre o assunto aumentando. Apesar de já ter praticado inúmeros esportes, inclusive integrando a equipe de natação do Flamengo quando tinha de 14 para 15 anos, hoje percebo que praticar um esporte é uma coisa, e outra, bem diferente, é se envolver com a sua gestão e fomento.

Por um lado tivemos o crescimento do investimento público no esporte e resultados expressivos foram alcançados no vôlei, natação e judô. O atletismo também tem resultados para mostrar, mas menos do que na vela, onde a família Grael aqui do Rio seja talvez a maior usina de medalhistas olímpicos do mundo.

Mas será que esta estratégia de investir pesadamente somente nos atletas que alcançam índices olímpicos é a melhor alternativa ? O futebol, certamente o esporte que recebe mais investimentos aqui no país, esta agora sendo questionado nem tanto por não ter conquistado o hexa, mas pela forma terrível como saímos da competição. Muitos afirmam com convicção que o nosso futebol precisa ser completamente reformulado ! Seria somente o futebol ?

Creio que todos vão concordar que temos sim inúmeros talentos esportivos no Brasil e que todos gostamos de torcer por eles, especialmente quando alcançam o lugar mais alto do pódio. Esta talvez seja a principal razão para a gestão do esporte no Brasil justificar a estratégia adotada, montando programas de incentivo para o alto rendimento e concentrando os investimentos nos atletas de elite. Recentemente mais um destes programas foi anunciado para garantir (?) que nas Olimpíadas do Rio conquistemos um número recorde de medalhas.

Entretanto, o tal do espírito olímpico afirma que o importante é competir ! Seria esta apenas uma afirmação para mascarar o fato de que o que importa mesmo é a vitória ? A qualquer preço ? Ou será que o gosto da vitória corrompe e que não existe mais lugar para o espírito olímpico no esporte profissionalizado ?

Ouvi gente dizendo que era preciso o governo intervir para dar jeito na coisa. Até porque o governo vem colocando muito dinheiro no esporte mas as histórias sobre clubes que não pagam impostos e que atrasam o salário de seus atletas continuam sendo rotina. A verdade é que a estrutura do esporte no Brasil é ainda precária e convive com mecanismos de gestão duvidosos e pouco transparentes.

Pessoalmente não creio que a gestão do esporte, principalmente o profissional, deva ser conduzida e financiada pelo governo. Também não creio que o governo deva se eximir de lidar com o esporte, principalmente o esporte de base, que precisa de investimentos do governo. Creio ainda que o esporte deva ser encarado como parte da educação dos indivíduos, desde os primeiros anos de escola.

Na minha opinião, o Estado deve ter um tamanho ótimo, trabalhando sempre pelo bem da sociedade, buscando de forma permanente o equilíbrio e a justiça de acordo com as crenças e valores do seu povo. Assim, deve promover a competição, mas garantindo a lisura da disputa através do estabelecimento de regras e da fiscalização que garantam que elas sejam cumpridas. Vejam que esta afirmação é valida tanto para os esportes como para os negócios em geral.

Natural, portanto, que o legislativo determine as formas possíveis para que entidades privadas (com ou sem fins lucrativos) se organizem para atuar na área esportiva. Melhor ainda que exija determinados mecanismos de gestão e transparência de suas contas (a exemplo do que já se faz para empresas com ações na bolsa de valores), especialmente se estas organizações forem receber recursos financeiros de origem pública. Caberia ainda ao legislativo garantir recursos orçamentários para fazer frente aos investimentos necessários.

Aí entra em cena o executivo, que deveria ser capaz de executar tal orçamento, dialogando com o legislativo sobre programas e projetos prioritários. O maior deles, penso eu, seria um programa nacional de educação esportiva na base, mas dentro de um contexto de escola em tempo integral (para dar tempo de estudar, praticar esportes e desenvolver atividades artísticas e culturais). Voltarei a questão da escola pública em tempo integral numa outra oportunidade, mas já adianto que novas escolas a serem construídas deveriam contar com instalações esportivas que permitam inclusive receber algum público para acompanhar campeonatos internos e entre escolas.

Afinal, não é papel das escolas formar cidadãos capazes de assumir seus direitos e responsabilidades numa vida em sociedade ? Alguém vai negar que a prática esportiva permite expor os alunos-atletas a situações onde se entende na prática o significado da honra, lealdade e humildade, para citar apenas alguns dos valores que fazem parte do dia a dia do esporte ?

É claro que haverão alunos que vão preferir outras atividades mas todos terão oportunidade de experimentar diferentes modalidades, possivelmente participando de campeonatos internos, com os mais empenhados ou com mais aptidão vindo a integrar a equipe da escola e treinando com mais frequência. Entendo que isto tem o nome de esporte de base, fundamental para realmente reconhecer e valorizar o espírito olímpico, mas acima de tudo, para formar indivíduos capazes de contribuir para o bem comum.

Este casamento entre o estudo e o esporte poderia ir até o nível superior, mas aqui no Brasil, pelo menos no curto prazo, me parece que o esporte de base serviria de peneira para os atletas mais destacados conseguirem vaga nas equipes juvenis de clubes ou agremiações dos esportes mais populares. Isto não é ruim, especialmente se os clubes adotarem boas práticas de governança e se mantenham em dia com suas obrigações para com os atletas, funcionários e sociedade. Os esportes menos populares poderiam receber incentivos proporcionais, talvez concentrados em regiões geográficas com maior número de praticantes.

O importante, contudo, é criar um ambiente onde a transição do esporte amador para o profissional não seja maculada pela falta de ética e honestidade, punindo com rigor dirigentes, técnicos e atletas que atuem de forma antiesportiva. Nós, o povo, temos que fazer a nossa parte, valorizando os bons dirigentes e atletas e cobrando punição para quaisquer desvios. Aliás, devemos incluir aí os políticos, os empresários, os trabalhadores e quem mais fizer parte da nossa sociedade.

Sobre isto, conversei com várias pessoas nesta copa sobre os avanços tecnológicos introduzidos este ano, como o sensor dentro da bola para garantir que nenhum juiz deixasse de marcar um gol legítimo. Hoje temos sistemas de processamento de imagem que permitem acompanhar em tempo real as distancias percorridas por cada jogador, exibem ao vivo a linha de impedimento e muito mais. Houve tempo em que estas tecnologias não existiam ou eram muito caras, mas isto não é mais verdade.

Qual o argumento então para não utilizar a tecnologia para visualizar novamente uma jogada duvidosa ? A questão do custo ou do tempo necessário para exibir em câmera lenta, e por diferentes ângulos, uma jogada qualquer já não servem mais como desculpa, principalmente em competições de nível mundial. A FIFA, inclusive, parece já estar considerando esta possibilidade.

Eu me animo com isto, já que o velho argumento de que são estes lances polêmicos que dão um sabor especial ao futebol parece cada vez mais velho. Discordo daqueles que dizem que os gols contra roubados são compensados pelos gols roubados a favor do seu time. Isto inclusive permite um paralelo com o TIC:TAC que estou defendendo na campanha. O esporte será sempre um espetáculo onde os protagonistas são os atletas, com a tecnologia servindo de ferramenta. Mas cabe aos que fazem as regras do esporte (ou ao legislativo em relação as leis) estar atento aos avanços tecnológicos para, se economicamente viável, passar a utilizá-los pensando sempre no bem do esporte. Se necessário, inclusive ajustar as regras de modo a permitir que o uso da tecnologia garanta que a competição seja cada vez mais justa e que vença sempre o melhor.

Aí podemos entrar numa discussão sobre a força de um país para defender mudanças de regras em esportes praticados globalmente. Este questionamento é válido mesmo dentro de um país qualquer. Poderia o governo ou o legislativo determinar que a prorrogação de uma partida de futebol será sempre de dois tempos de 11 minutos cada ? Aqui no Brasil a justiça determinou a parada técnica por conta do calor … A regra valerá também para maratonas ? Eu não tenho respostas prontas para estas perguntas, mas sou simpático a ideia de uma Agencia Reguladora do Esporte, nem tanto para criar novas regras esportivas, mas para fiscalizar a gestão das federações e confederações. Só que vou deixar este assunto para uma outra oportunidade.

Encerro compartilhando com vocês, por coerência com a transparência que defendo na campanha, que eu mesmo, apesar de licenciado como vice-presidente do Sindicato das Empresas de Informática do Rio, venho ocupando o posto há muitos anos. Esclareço que o estatuto do sindicato não tem regras obscuras visando perpetuar seus dirigentes (esta publicado na internet). Lamentavelmente, ainda que continue motivado a contribuir com a entidade, a falta de renovação da diretoria é muito mais por conta da falta de novos voluntários. Também em outras entidades com as quais me relaciono vejo que são poucas as vezes em que temos mais de uma chapa nos períodos de eleição. Uma possível comparação é com a escolha do síndico do prédio, onde todo mundo tem uma reclamação sobre a atual gestão na ponta da língua mas ninguém quer assumir o posto. Diferente, portanto, da realidade em algumas organizações esportivas brasileiras.